O jornal Folha de São Paulo publicou, neste sábado dia 8/fev, a resposta do Dr. Marcos Eberlin, o grande nome do Design Inteligente brasileiro, à seguinte pergunta: O Design Inteligente, tido como uma vertente do criacionismo, é uma teoria científica válida? Em aproximadamente 4.000 caracteres, que é a quantidade de espaço reservado à publicação original, pretendo aqui fazer observações adicionais, de acordo com o interesse do público, a essa questão colocada pelo jornal.
Antes de propriamente responder à pergunta, é necessário clarificar do que o Design Inteligente (DI) trata.
O DI é entendido como uma teoria de detecção de design, desenvolvendo-se como um programa de pesquisa que afirma ser possível distinguir cientificamente objetos/eventos que tenham causas naturais daqueles que tenham causas inteligentes. Chamamos de causas naturais às explicações dadas para a origem de um objeto que envolvam somente leis físico-químicas da natureza. Chamamos de causas inteligentes àquelas explicações para a origem de um objeto que envolvam não apenas leis físico-químicas da natureza, mas também a infusão de complexidade especificada, sem a qual seria impossível a própria origem do objeto em questão. Por isso, a comunidade de pesquisadores do DI tem o propósito geral de solidificar os requisitos e as metodologias que permitam ao pesquisador/cientista fazer essa distinção de modo científico, ou seja, de modo independente da intuição do pesquisador e também reproduzível por outros cientistas segundo métodos bem definidos. Incorporando muitos dados científicos, leis já bem estabelecidas (como a biogênese), procede segundo as quatro etapas básicas do método científico (observação, hipótese, experimentação e conclusão) para detecção de design. Assemelha-se, portanto, a outras ciências já estabelecidas, como as ciências forenses, à arqueologia e ao SETI, tomando os mesmos métodos e aplicando-os às entidades biológicas. Um grande exemplo da aplicação desse método é o artigo The “Wow! signal” of the terrestrial genetic code (Icarus, 2013), bastante inspirado em Carl Sagan.
Um postulado do DI é que informação complexa e específica tem origem somente em agentes inteligentes. Um dos tipos de complexidade especificada é a complexidade irredutível, conceito proposto por Michael Behe em A Caixa Preta de Darwin, que é o conceito falseador daquela famosa afirmação de Darwin, de que “se pudesse ser demonstrado que algum órgão complexo existiu e que não poderia ter sido formado por leves modificações numerosas e sucessivas, minha teoria seria absolutamente destruída”. Contudo, a complexidade irredutível é apenas um dos conceitos surgidos no DI. As teses do ajuste fino e de antevidência também estão sendo introduzidas na ciência, sendo gradativamente aceitas pela comunidade científica geral. Tais conceitos podem ser compreendidos em livros como Signature in the Cell, Darwin’s Doubt, Darwin Devolves e Antevidência.
Torna-se claro que o DI é bastante diferenciado do Criacionismo. Não é possível, pelo DI, identificar o(s) designer(s) detectados pelos seus métodos, enquanto o Criacionismo identifica esse designer como a divindade da tradição judaico-cristã. O DI, segundo o método científico, não se aventura a “entrar na mente” do designer, focando-se apenas na detecção de design ou não nos artefatos materiais. Entende-se, portanto, que o Criacionismo é uma vertente do DI, e não o contrário como sugerido na pergunta, uma vez que a visão pessoal (filosófica ou religiosa) poderá identificar o designer como alguma divindade da sua preferência, ou até mesmo a ETs via panspermia.
Como explicar a satisfação intelectual de Richard Dawkins em seu ateísmo por causa da evolução? E Anthony Flew, o grande nome do ateísmo do século XX, que abandonou seu ateísmo em favor do DI? Ou até Fred Hoyle, que rejeitava a teoria do Big Bang por acreditar que ela fosse pseudociência, e hoje é uma teoria largamente aceita sobre a origem do universo, além de acreditar numa forma materialista de DI, chamada panspermia? A explicação para tudo isso é: a relação da ciência com a religião é muito mais rica e complexa do que imaginam os críticos modernos do DI, usualmente reduzindo essa relação a uma mera briga política. O famoso problema da “demarcação” na filosofia da ciência costuma ser mal representado por esses críticos como se fosse um enfrentamento entre ciência e religião. O que é um debate filosófico, completamente válido dentro dos murais da academia, se transforma em um problema ideológico, que é precisamente do que a comunidade do DI procura se afastar. O DI mantém sua discussão aos achados científicos, expandindo a ciência para onde as evidências nos levam. Por isso, ele também rejeita limitações arbitrárias impostas pelo materialismo/naturalismo, filosofia segundo a qual aquelas ciências já estabelecidas citadas como exemplo não seriam possíveis.
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