Um texto publicado no El País afirma: “DNA criado em laboratório duplica o alfabeto genético para capturar o câncer”. O texto afirma que uma equipe de cientistas “expandiu o alfabeto para incluir quatro novas letras (Z, P, S e B)”, além das quatro letras do DNA padrão (A, T, C, G). Isso é muito interessante, mas o que isso nos diz sobre a natureza do código genético? Bom, o texto está repleto de referências à evolução e à riqueza de possibilidades através desta expansão, mas quais são os fatos?
Em primeiro lugar, assim como no caso da suposta multicelularidade, também não é algo novo e já apareceu na mídia popular em 2014 (artigo), há referência de outro artigo sobre expansão do código de 4 para 6 letras publicado em 2011, sem contar outro de 2006. Na ocasião de 2014, apenas pensei em escrever sobre o caso. Agora reaparece a oportunidade. Vejamos as afirmações:
O DNA natural tem as quatro letras que tem por “uma série de contingências históricas”, então alguns fundamentos bioquímicos diferentes poderiam dar lugar a uma vida completamente diferente. “O lançamento dos dados poderia ter caído de outra forma”, resume.
Esse é um ponto a se explorar: uma série de contingências históricas misteriosas ou inexistentes?
“Ao aumentar o alfabeto genético para oito, melhoramos a capacidade de evolução do sistema”, diz Benner. As quatro novas bases incluem grupos moleculares de maior atividade bioquímica que as bases convencionais. “O potencial para criar moléculas de RNA com funcionalidade própria é muito grande”, acrescenta.
Se a evolução é melhor nesse sistema, por que ela não aconteceu? Por que o sistema “congelou” na forma que conhecemos?
Uma vez que existem apenas 20 aminoácidos, mas as quatro letras genéticas clássicas podem ser combinadas em 64 tripletos diferentes, existem “palavras” de DNA supérfluas às quais os cientistas conseguiram atribuir novos significados, correspondentes a aminoácidos sintéticos. “Nós fizemos isso há duas décadas”, diz Steven Benner, o principal autor do artigo, ao EL PAÍS. “Neste estudo não usamos as novas letras do alfabeto genético para criar palavras no léxico das proteínas.”
Essa parte é interessante, com “supérfluas” ele se refere a redundância do código para imunização de ruído. Também destaca as mais de duas décadas de desenvolvimento da técnica e, por fim, diz que não usaram as novas letras para criar correspondência com proteínas. O primeiro ponto indica que reduziram a imunidade do código. O segundo ponto demonstra o esforço para pequenos passos (uma década de esforço científico equivale a milhões de anos de evolução natural). O terceiro ponto é óbvio: eles não conseguiriam fazer proteínas para um novo código tão cedo (especialmente com aminoácidos sintéticos), o esforço do design de proteínas é hercúleo.
Enfim, em 2014 algumas pessoas tomaram a expansão como evidência da origem evolutiva do código: se é possível expandir, então é “evolucionável”. Mas parece que o cenário é muito diferente e essa percepção é ingênua.
Exposição das Especulações Evolutivas
Tecnicamente, em uma perspectiva evolutiva, os códigos menores deveriam ser muito mais simples e fáceis de implementar para o nosso nível de conhecimento atual. Nas especulações evolutivas, um pequeno conjunto dos códigos possíveis surgiu e evoluiu em muitas variedades, explorando muitas combinações, até que o código padrão (ótimo) se estabelecesse, e isso aconteceu muito cedo na história da vida. “Cedo” porque o número de quatro bases é universal e, na perspectiva evolutiva, permanecem a partir de um ancestral universal comum.
Enquanto é suposto que as espécies mudam indefinidamente, essas características parecem “congeladas”. Seria possível reduzir o código genético? Simplificá-lo? Por que não encontramos nenhuma dessas formas transicionais na vasta sucessão de intermediários hipotéticos? É certo que esforços na abordagem “top-down”, que trata da redutibilidade dos sistemas, têm sido infrutíferos e frustrantes sobre isso. Como encontrar um código ligeiramente menor em termos de “letras”. Um código de 2 letras, por exemplo, resultaria na possibilidade de apenas 8 aminoácidos. É possível produzir organismos com 8 aminácidos?
A Habilidade Nanobiotecnológica
Um dos melhores cientistas do mundo, James Tour, disse pagar um almoço pra quem conseguir explicar pra ele a evolução a nível bioquímico (ele está bem aberto às evidências). Ele trabalha com nanobiotecnologia e produziu o “nanocar” (um carro minúsculo). E isso ilustra bem a habilidade que temos hoje a nível molecular. O que faltar para se recriar uma sucessão de sistemas cada vez mais simples que demonstrem a origem do código genético? Não custa recordar a lógica de onde tiramos essas expectativas:
Vimos como é esmagadoramente improvável que os seres vivos, com seu primoroso “design”, tenham surgido por acaso. Mas então como foi que vieram a existir? A resposta … é que ocorreram transformações graduais, passo a passo, de um início simples, de entidades primordiais suficientemente simples para terem surgido por acaso. Cada mudança sucessiva no processo evolutivo gradual foi simples o bastante, relativamente à mudança anterior, para ter acontecido por acaso.
Richard Dawkins. O Relojoeiro Cego: A teoria da evolução contra o desígnio divino. Companhia das Letras. 2001.
Portanto, nada mais distante da realidade. Talvez por isso a pesquisa científica é tão repetitiva em assuntos evolutivos. Lembrando que as tentativas de se demonstrar a espontaneidade, a simplicidade das formas intermediárias e um vasto espaço de possibilidades evolutivas, com os esforços ao longo do tempo, demonstram o exato oposto (Paradoxo das Promissórias).
“Mas o código foi expandido, isso significa que não existe design!”
Por quê? Essa afirmação dificilmente seria justificada. Não existe argumento além do simples desejo de que não seja design. Aliás, algumas das características intrínsecas dos sistemas informacionais de design são serem passíveis a engenharia reversa, edição e também a suscetibilidade ao tempo.
Observação: o termo para divulgação popular “letra” se refere a bases nitrogenadas.
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